Enquanto o Brasil celebra o sucesso inicial do programa Crédito do Trabalhador, que atingiu 52,4 milhões de simulações em menos de uma semana, dados recentes dos Estados Unidos mostram um mercado de trabalho resiliente, com 221 mil pedidos de auxílio-desemprego na semana de 20 de março de 2025 e uma taxa de desemprego estável em 4,1%, segundo o Departamento do Trabalho americano. No Brasil, a taxa de desocupação subiu para 6,5% em janeiro de 2025, mas a informalidade ainda atinge 38% da força de trabalho, conforme o IBGE. Diante de realidades tão distintas, cabe perguntar: o que o Brasil, com seu sistema de proteção social ancorado no FGTS e no seguro-desemprego, pode aprender com os EUA para fortalecer o mercado de trabalho formal e melhorar o suporte aos desempregados?
Dois Cenários, Muitas Diferenças
Nos Estados Unidos, o mercado de trabalho segue robusto. A taxa de desemprego de 4,1% é uma das mais baixas em décadas, e os pedidos de auxílio-desemprego caíram para 221 mil na semana encerrada em 20 de março de 2025, um reflexo de uma economia que, apesar de desacelerar, mantém a criação de empregos. Lá, o seguro-desemprego é gerido por cada estado, mas financiado por impostos federais e estaduais pagos por empregadores. O valor médio do benefício varia entre US$ 300 e US$ 600 por semana, dependendo do estado, e pode ser pago por até 26 semanas, com extensões em crises econômicas. Além disso, os EUA têm investido em programas de requalificação profissional, como os oferecidos pelo Workforce Innovation and Opportunity Act (WIOA), que conectam desempregados a treinamentos e novas oportunidades.
No Brasil, a taxa de desocupação subiu para 6,5% em janeiro de 2025, um aumento de 0,3 ponto percentual em relação a dezembro de 2024, segundo o IBGE. Apesar disso, o mercado formal mostra sinais de crescimento: o Caged registrou um saldo positivo de 201 mil vagas formais em 2024, um aumento de 29% em relação ao ano anterior. O seguro-desemprego brasileiro, atualizado em janeiro de 2025, varia entre R$ 1.518 (o salário mínimo) e R$ 2.424,11, pago por 3 a 5 parcelas, dependendo do tempo de serviço. Embora o benefício seja um alívio para os 7 milhões de desempregados, o valor é insuficiente para cobrir as necessidades básicas em um país onde o custo de vida não para de subir – a inflação projetada para 2025 é de 5,5%, segundo o Boletim Focus do Banco Central.
Informalidade e Desigualdade: O Calcanhar de Aquiles Brasileiro
A informalidade é um dos maiores desafios do Brasil. Dos 103 milhões de ocupados no terceiro trimestre de 2024, 38% estavam na informalidade, segundo o IBGE, o que significa que mais de 39 milhões de trabalhadores não têm acesso a direitos como o seguro-desemprego ou o FGTS. Essa realidade contrasta com os EUA, onde a informalidade é bem menor – cerca de 10% da força de trabalho, segundo o Bureau of Labor Statistics. A alta informalidade no Brasil não só limita o alcance do seguro-desemprego como perpetua desigualdades regionais, de gênero e raça. O pesquisador Marcelo Manzano, da Unicamp, aponta que jovens, mulheres e negros são os mais afetados pelo desemprego, com taxas de desocupação que chegam a 15% entre jovens de 18 a 24 anos.
Nos EUA, a abordagem ao desemprego é mais dinâmica. Além do seguro-desemprego, o governo federal e os estados investem em programas de requalificação que ajudam os trabalhadores a se adaptarem às demandas do mercado. Em 2024, por exemplo, o estado da Califórnia destinou US$ 1,2 bilhão para iniciativas de treinamento em tecnologia e energias renováveis, setores em alta. No Brasil, programas como o PEQ (Programa Estadual de Qualificação Profissional) em São Paulo existem, mas falta escala e coordenação nacional. Muitos trabalhadores desempregados recorrem a cursos gratuitos do Senai ou Sebrae, mas a oferta é limitada, e a conexão com vagas reais é insuficiente.
O Papel do Seguro-Desemprego e do FGTS
O seguro-desemprego brasileiro tem um alcance significativo, mas suas limitações são evidentes. O teto de R$ 2.424,11, mesmo ajustado pela inflação (4,77% em 2024, segundo o INPC), não acompanha o aumento real do custo de vida, especialmente em grandes centros urbanos. Além disso, o prazo para solicitação – 120 dias para trabalhadores formais e 90 dias para empregados domésticos – pode excluir quem não tem acesso imediato a informações ou enfrenta barreiras burocráticas. Nos EUA, o sistema é mais flexível: os pedidos podem ser feitos online em poucos dias, e os benefícios são ajustados regularmente com base nos salários médios, que cresceram 3,8% em 2024, superando a inflação de 2,9%.
O FGTS, um pilar da proteção social no Brasil, também enfrenta desafios. Programas como o Crédito do Trabalhador, lançado em março de 2025, utilizam até 10% do saldo do FGTS como garantia, o que pode comprometer a reserva de emergência do trabalhador em caso de demissão. Nos EUA, não há um fundo equivalente ao FGTS, mas o sistema de aposentadoria (401k) e os benefícios de desemprego oferecem uma rede de segurança mais previsível, embora menos abrangente para trabalhadores de baixa renda. A alta dependência do Brasil no FGTS – que rende apenas 5,1% ao ano, abaixo da inflação – levanta questões sobre sua sustentabilidade como ferramenta de proteção social.
O Que o Brasil Pode Aprender?
O Brasil pode se inspirar nos EUA em três frentes principais. Primeiro, na requalificação profissional: o governo brasileiro precisa investir em programas nacionais de treinamento que conectem desempregados a setores em crescimento, como tecnologia e energia verde, a exemplo do que ocorre na Califórnia. Segundo, na flexibilização do seguro-desemprego: simplificar o acesso, aumentar o valor do benefício e estender o prazo de solicitação podem ajudar a incluir mais trabalhadores, especialmente os informais. Terceiro, na redução da informalidade: políticas que incentivem a formalização, como a desoneração de encargos para pequenas empresas, podem ampliar o acesso a direitos trabalhistas, a exemplo do que ocorreu nos EUA com incentivos fiscais para empregadores.
No entanto, o Brasil não deve copiar cegamente o modelo americano. O sistema dos EUA, embora eficiente para a classe média, deixa lacunas para os mais pobres, com 12% da população sem acesso a benefícios de desemprego, segundo o Center on Budget and Policy Priorities. O Brasil, com sua tradição de proteção social via FGTS e seguro-desemprego, tem uma base sólida para construir um sistema mais inclusivo, desde que enfrente os desafios da informalidade e da desigualdade com políticas estruturais.
Um Futuro Mais Seguro para o Trabalhador Brasileiro
A comparação entre Brasil e EUA revela realidades distintas, mas complementares. Enquanto os EUA mostram como a requalificação e a flexibilidade podem sustentar um mercado de trabalho dinâmico, o Brasil precisa adaptar essas lições à sua realidade, marcada por desigualdades históricas e alta informalidade. O Crédito do Trabalhador pode ser um passo na direção certa, mas seu sucesso dependerá de como o governo equilibrará o uso do FGTS com a proteção social de longo prazo.